I
Assim fugi de Moscou para Berlim.
Dez dias antes de expirar o prazo de licença, apresentei-me ao chefe da Administração da Indústria, expressando o desejo de reassumir o serviço. Alexandrov pareceu agradàvelmente surpreso.
– Descansou bastante em Moscou? perguntou-me.
– Bastante.
– Você não poderia ter chegado em momento mais cportuno, disse êle, atacando o serviço. Metade do pessoal está de licença e, nêste momento, o comandante supremo confiou-nos missão urgente e de responsabilidade. Temos que obter dados contra as organizações de demolição para serem enviados a Moscou.
Dispendeu êle meia hora discutindo a tensão surgida entre o Departamento de Reparações da A.M.S. e a Comissão Especial de Demolição criada pelo Conselho de Ministros da U.R.S.S. A fim de justificar a atitude da A.M.S. tínhamos que coligir dados incriminadores a respeito das atividades da Comissão Especial. A Administração da Indústria recebera ordens para colocar à disposição do comandante supremo uma Comissão especial de vários engenheiros. Oficialmente, sua tarefa era coordenar o trabalho da A.M.S. e da Comissão Especial, mas, oficiosamente, estariam encarregados de obter informações atacando os demolidores. A comissão deveria visitar todas as indústrias mais importantes da zona soviética.
– Se concordar, designá-lo-ei membro da comissão, disse Alexandrov, em conclusão. Especialmente porque você conhece alemão, pois será necessário entrar em contacto íntimo como os diretores das fábricas alemães.
Viagens contínuas e visitas a fábricas! Nas próximas semanas, possivelmente durante mêses, estaria livre de Moscou e também de Karlshorst. Não poderia esperar coisa melhor, no momento, de modo que prontamente aceitei a sugestão de Alexandrov. No dia seguinte fui designado para a Comissão de Coordenação, que era diretamente responsável perante o Comandante Supremo.
Eis, portanto, um cidadão soviético, que fugira de Moscou, um oficial soviético que não podia encontrar sossêgo em Karlshorst, que, ao mesmo tempo, era emissário do Comandante Supremo da A.M.S., trabalhando para Moscou. Coincidência fortuita? Não! Lei da progressão.
II
O automóvel, côr de cinza, corria pela estrada monótona, atravessando o ar fresco de outono. Um bando de perdizes vôou sôbre o campo que marginava a estrada.
– Vamos dar uns tiros, propôs o Major Dubov, pegando a arma de dois canos, colocada atrás do banco.
– Por que êsse incômodo? respondi. De qualquer modo teremos que entregar o saco a alguém.
– Melhor ainda! riu o major. Pode ser um meio de fazer alguém falar. Vassily Ivanovich. As armas!
Nosso motorista, Vassily, era um homem idoso, um ex-soldado. Baixando uma das vidraças do carro, saíu da estrada. O mecanismo de pensar da perdiz é um pouco restrito: não deixa um homem aproximar-se, mas quase que se pode atropelá-la, com um carro.
Karlshorst estava longe de nós. Nos bolsos tínhamos documentos plenipotenciários, assinados pelo Marechal Sokolovsky, válido para o distrito da Turíngia e concedendo-nos poder para realizar missões especiais para o Comandante Supremo da A.M.S. na Alemanha. Isso seria suficiente para abrir todas as portas da Turíngia, mas se falhasse no objetivo, possuíamos um segundo documento, concedendo-nos "plenos poderes para verificar o cumprimento da ordem n.°.... da A.M.S. e o decreto do Conselho de Ministros da U.R.S. de..."
Êsses documentos ressoantes eram destinados principal mente ao General Dobrovolsky, plenipotenciário da Comissão Especial de Demolição e também diretor soviético da fábrica Zeiss de Jena. Embora fôsse cem por cento civil, e, antes tivesse sido de uma fábrica de ótica na Rússia, e além disso membro da ambígua tribo dos "demolidores", gozava de autoridade, pois tinha posições fortemente entrincheiradas em Moscou.
Ainda que o Marechal Sokolovsky tivesse baixado ordens severas para que todos os membros das organizações de demoição usassem roupas civis, Dobrovisky comportava-se como se nunca tivesse ouvido falar nessa ordem. Sempre que Sokolovsky se encontrava com Dobrovolsky, o marechal se dirigia ao general em tom irônicamente amistoso, usando a forma civi de tratamento, ignorando o regulamento militar que manda que se use o tratamento correspondente ao pôsto.
Além desse apêgo infantil às insignias do pôsto, Dobrovolsky também era notório pela rudeza. Era conhecido por ter atirado escada abaixo oficiais que chegavam para fiscalizar suas atividades ou então recusado acesso à fábrica, dizendo-lhes, polidamente:
– Se nao gostar, queixem-se a Moscou.
Mas, a fim de fazer queixa era necessário ter provas e isso não se obtinha da fábrica Zeiss a não ser através de Dobrovolsky.
Se a Administração Militar Soviética tinha inimigos internos e antagonistas na Alemanha, eram êles encontrados, principalmente entre as pessoas coletivamente conhecidas por demolidores. O General Zorin, chefe da Administração de Entregas e Reparações fizera um número enorme de vas tentativas para trabalhar com êles, mas afinal, abandonara tôdas as esperanças. Agora, todos os contactos com êsses corpos, que, frequentemente, distavam poucos minutos de Karlshorst, eram feitos através de Moscou, em forma de queixas, exigências e informações sobre fracassos na realização do plano de reparações em virtude da atividade dos demolidores. Mas êstes somente riam e continuavam em busca na zona soviética, de qualquer coisa que a A.M.S. ainda não tivesse requisitado. Mas até as requisições não eram de muito valor, pois os demolidores ràpidamente entravam em contacto com Moscou, resultando disso, geralmente, que logo vinha uma ordem para que a A.M.S. entregasse o objeto em questão a essas organizações.
O trabalho das organizações de demolidores era dirigido pela Comissão Especial de Demolição, organizada pelo Conselho de Ministros e, portanto, pelo próprio Conselho de Ministros, juntamente com os ministérios diretamente interes sados. O resultado era uma espécie de competição socialista: duas leiteiras a ordenhar, assiduamente uma vaca! Uma das leiteiras agia como ladrão de caças, tirando o máximo que podia e fugindo. Eram os demolidores. Da outra, os mestres primeiro exigiam leite, depois dependuravam a vaca semi-morta, pelo pescoço, exigindo que continuassem a ordenhar, ordenhar. Essa era a A.M.S. Não importava o que acontecesse à vaca e às duas leiteiras, os donos extraiam o leite até a última gota.
Logo que o Exército Vermelho atravessou a fronteira alemã, brigadas especiais do exército receberam a incumbência de arrecadar e avaliar os despojos de guerra até ao ponto de desmantelar fábricas industriais. Quando se verificou que essas brigadas não podiam realizar cabalmente a missão, organizaram-se, mais ou menos arbitràriamente, corpos de demolidores, que, mais tarde foram subordinados à Comissão Especial de Demolições. Cada Comissariado do Povo, as principais administrações dos comissariados e até fábricas soviéticas enviaram suas próprias brigadas de demolição à Alemanha. Essa atividade estava em pleno furor. As coisas chegaram até um ponto em que mesmo a Biblioteca de Lenine, do Estado em Moscou, mandou seus próprios especialistas para retirar as obras de Goethe e Schiller, enquanto que o Estado Dinamo de Moscou enviou, apressadamente, o quadro de futebol à Alemanha em busca de uma piscina que pudesse ser desmontada.
Os demolidores recebiam patentes militares na segunda base: um técnico tornava-se tenente, um engenheiro, major, um diretor, coronel e um alto funcionário ministerial, general. As autoridades que haviam organizado os demolidores não se preocupavam com os problemas, mas a A.M.S. estava sempre com dôr de cabeça quando tinha que entrar em contacto com êsses oficiais civis. Com o decorrer tornaram-se mais apegados às funções e a A.M.S. tinha mais complica ções ainda quando se propunha a desorganizá-los.
O Major Dubov estava comigo, nessa viagem, pelo fato de ser especialista em ótica e máquinas de precisão e, além disso, havia ainda a vantagem de êle e Dubrovolsky terem sido colegas de escola. Enquanto êle recordava ao general os fatos dos velhos dias, eu estaria livre para preparar a queda do nosso inimigo e rival n.º1.
No caso da fábrica Zeiss, o conflito de interêsse entre a A.M.S. e a Comissão Especial era muito grave. Depois do primeiro espasmo de demolição, na Alemanha, que a A.M.S. não teve nem tempo nem desejo de evitar, começaram a surgir as considerações econômicas. Desde o princípio da Comissão Especial insistira que a fábrica Zeiss fôsse desmontada e transferida para a União Soviética o que, sob o aspecto da estrategia militar era certo, mas havia dificuldades a enfrentar. O âmago do problema era que a fábrica era de relativo valor; de fato, não possuia maquinária que já não existisse na U.R.S.S. O valor da Zeiss estava nos técnicos, desde os polidores comuns, que haviam trabalhado ali, a vida inteira e que haviam transmitido as experiências pessoais, de geração à geração, até os engenheiros, que haviam estabelecido as fórmulas clássicas da mecânica ótica. Sem êsses homens, a fábrica Zeiss inteira não valeria um vintém na União Soviética mas a transferência completa da fábrica com o pessoal teria sido muito difícil e muito arriscado.
Fêz-se a tentativa de acomodação, propondo-se que operários e técnicos soviéticos fizessem estágio em Jena, que, depois da volta à União Soviética, dirigiriam a fábrica desmontada e aplicariam as experiências técnicas da Zeiss. Esse plano foi pôsto em execução, até certo ponto, mas inadequadamente. O Cremlin era muito relutante em permitir que seus filhos viajassem ao extrangeiro, até mesmo na Alemanha ocupada, pois poderiam aprender outras coisas além da experiência técnica da fábrica Zeiss.
A primeira operação de demolição não deu resultado, pois o equipamento Zeiss enviado à União Soviética pouco contribuiu para a economia do país, enquanto que a fábrica principal, assim amputada, excedeu às espectativas, já que continuava a fabricar produtos Zeiss, para o espanto do General Dobrovolsky, que, após a completação da desmantelação, permanecera em Jena como diretor soviético da indústria. Pouco se interessava êle pela produção, pois ela se destinava à Adminisração de Reparações da A.M.S. e todos os laureis pertenciam ao seu inimigo declarado, o General Zorin.
Por outro lado, a A.M.S. estava profundamente interessada na fábrica, porque sua produção começava a desempenhar uma parte importante nas contas de reparação. Se a segunda fase de desmantelação se realizasse, pelo que insistia Dobrovolshy, a A.M.S. perderia considerável contribuição. O Conselho de Ministro nunca reduziria a quota de reparação, de modo que novas fontes teriam que ser desco bertas, o que, com o decorrer do tempo, cada vez mais se tor nava difícil. Iniciou-se então um duelo entre a A.M.S. e a Comissão Especial. Dobrovolsky, solenemente, assegurou a Moscou que se, afinal, a fábrica Zeiss fôsse transferida e montada na União Soviética, dentro de doze mêses estaria produzindo uma quantidade equivalente a cem milhões de rublos.
A A.M.S. contra-golpeou da seguinte forma, declarando que a primeira secção desmantelada da fábrica Zeiss, já montada na União Soviética tinha um deficit de cinquenta milhõe dos rublos, sendo necessário subsídios frequentes, enquanto que a fábrica Zeiss, semi-aleijada, de Jena, anualmente produzia uma quantidade de reparações equivalente a vinte milhões de marcos.
O conflito assumiu um aspecto inesperado para ambas as partes. Depois de estudar os relatórios das duas partes, Moscou ordenou:
"O número correspondente de técnicos alemães especializados deve ser retirado do pessoal da fábrica Zeiss, em Jena e nas firmas subsidiárias, para trabalhar na indústria ótica da União Soviética, principalmente na fábrica Zeiss transferida, devendo ser recrutados na seleção dos especialistas e a execução desta ordem ficam ao cargo do diretor da fábrica Zeiss, em Jena, o Camarada Dobrovolsky. Ao mesmo tempo ordena-se que se faça a restauração da principal indústria eZiss-Jena, de acordo com decretos anteriores. Assinado: Ministro da Indústria de Precisão, com poderes plenipotenciários do Conselho de Ministros da U.R.S.S.
Dessa forma, Dobrovolsky havia conseguido sucesso parcial. Decidira-se que o primeiro passo era a transferência dos técnicos da Zeiss, mas como compreender o fato de que o mesmo decreto ordenava a destruição e a restauração da mesma empresa?
Dias antes, havia eu lido no 'Taegliche Rundschau' uma carta nauseante, escrita por um dos especialistas alemães que haviam sido enviados à União Soviética, à base de contrato individual, o que, na realidade, significava compulsão. O feliz especialista apressava-se a informar ao mundo que estava passando bem e que recebia 10.000 rublos por mês. No mesmo período o Marechal Sokolovsky recebia 5.000 rublos por mês e os engenheiros soviéticos, recebiam em média, entre 800 a 1.200 rublos.
A ordem foi cumprida: consideração porção de operários e especialistas foram enviados de Jena para o Oriente, "na base de contratos individuais". A produção da Zeiss caíu. Dobrovolsky celebrou a vitória, procurando convencer todo mundo da certeza da sua teoria de que a fábrica Zeiss deveria ser transferida totalmente, mas o Major Dubov e eu estávamos a caminho de Jena, como espiões aventurando em campo inimigo.
– Meu velho colega, como vão as coisas? perguntou o Major Dubov, ao apertar a mão de Dobrovolsky.
– Que ventos os trouxe aqui? disse o general, recebendo o velho colega de maneira pouco amigável, pois comportava-se como um ditador na fábrica, simultâneamente como um comandante de uma fortaleza sitiada, especialmente quando os visitantes cheiravam a A.M.S.
Fiquel de lado, examinando os modelos de produtos Zeiss, presos à parede, a fim de dar a impressão de que não me interessava, absolutamente, por negócios, mas, quando o Major Dubov conduziu Dobrovolky ao gabinete particular, pus-me a trabalhar ao flanco do general.
Pela porta de comunicação, passei da sala de espera de Dobrovolsky para a sala do diretor alemão. Mostrei à secretária os documentos com a assinatura do Marechal Sokolovsky e manifestei desejo de ver o diretor que ficou satisfeito ao ver-me e apressou-se a desfazer-se dos visitantes que estavam com êle. Era um jovem mais ou menos jovem e membro do Partido Unitário Socialista. Apenas recentemente fôra operário do departamento de acondicionamento da fábrica e, no momento, era o diretor. Exatamente a espécie de homem que me servia. Não era inteligente, mas enérgico.
– Bem, Herr Diretor, como vão as coisas? perguntei.
Eu sabia muito bem que dois sentimentos lutavam dentro dêle o mêdo de Dobrovolsky e o sentimento do profissional ou do dever nacional, se é que essas concepções existam nos membros do Partido Unitário Socialista. Devia êle saber que a A.M.S. defendia os interêsses da fábrica, no que tocava a sua existência, de modo que eu não precisava dizer-lhe isso. Apenas queria ter a certeza de que Dobrovolsky não sabia coisa alguma da nossa conversa.
A despeito do seu verdadeiro desejo de desarmar as armas de Dobrovolsky, minha conversa com êle não adiantou muito. Agradeci-lhe a informação excepcional inútil e pedi permissão para falar com o chefe do corpo técnico "para elucidar certos pormenores". Ele apressou-se a colocar-me o seu escritório à disposição e, minutos depois, um homem guapo, de óculos de tartaruga e de macacão branco, entrou. Era êle de feitio diferente. Olhei-o silenciosamente e sorri, como se fôsse um velho conhecido. Eu já obtivera informações a respeito dos diretores técnicos da fábrica, de modo que após algumas observações preliminares sobre a Zeiss e a produção, nos compreendíamos perfeitamente.
Disse-lhe, fracamente, que, embora não me movesse impulsos filantrópicos, meu objetivo, não obstante, era livrar a fábrica do regime de terror de Dobrovolsky. Nêsse caso, éramos aliados involuntários. Assegurei-lhe que a conversa seria mantida em segrêdo e êle, declarou estar pronto a colocar o conhecimento e experiência à disposição da A.M.S.
– Segundo sua opinião, quais são os espinhos da fábrica, Herr doutor? perguntei, tentando minimizar a situação catástrófica empregando o eufemismo "espinhos".
– Eu diria simplesmente "dificuldades"! respondeu êle, sorrindo um pouco. Há falta de tudo, mas o fato principal é que perdemos os nossos cérebros, nossos especialistas. E êsse prejuizo não poderá ser refeito senão após décadas.
E êle prosseguiu no seu quadro vivido. Ao contrário a indústria soviética, a indústria alemã depende, até certo ponto, da cooperação das empresas congêneres. Na União Soviética, as considerações econômicas eram sacrificadas a fim de se conseguir a autonomia na indústria, grande ou pequena, quer em escala nacional quer em consideração ao indivíduo e as fábricas. Essa decisão foi decidida não tanto pelos fatores econômicos como por fatores militares estratégicos.
A base da economia capitalista é que a produção, pelo menos, deve compensar. A estrutura de qualquer emprêsa e sua viabilidade são governadas por cálculos rigidamente econômicos e um balanço ativo. Os economistas ocidentais considerariam absurdo que, na União Soviética, a maioria das principais emprêsas básicas industriais trabalhem com prejuizo e sejam dependentes de auxílio estatal, que o Estado tira da indústria leve aumentando o preço dos meios de consumo e da agricultura coletivizada.
– No momento estamos trabalhando com velhos estoques e semi-manufacturas. Não recebemos entregas. Quando os estoques terminarem... interroupeu o diretor técnico, estendendo as mãos, em desespêro. Nossos fornecedores na zona soviética, de antes da guerra, na maior parte deixaram de existir. A matéria prima prometida da União Soviética ainda não começou a chegar. É pràticamente impossível obter qualquer coisa da zona ocidental. Já tentámos mandar caminhões até a fronteira para, ilegalmente, por nosso risco, trazer alguns artigos, mas isso não é solução.
Em maio e junho de 1945, imediatamente após a queda de Berlim, os demolidores soviéticos, apressadamente, desorganizaram as indústrias em Siemenstadt, o coracão da indústria eletro-técnica alemã. Já nessa ocasião, antes da Conferência de Potsdam, sabia-se que a capital da Alemanha deveria ser ocupada pelos quatro aliados. Oficialmente essa decisão foi tomada a 5 de junho de 1945, em virtude de um acordo inter-aliado, mas a entrada dos aliados ocidentais, em Berlim. foi artificialmente retardada por outro mês. A razão? Demolição. As brigadas soviéticas de demolicão trabalhavam dia e noite nos setores de Berlim a serem entregues. E trabalharam com seriedade: até mesmo os canos das privadas foram retirados.
Um ano mais tarde visitei Siemenstadt. na companhia do Coronel Vassiliev, que estivera encarregado dos trabalhos da demolição dessas fábricas. Ele sacudiu a cabeça, em admiração:
– De onde tiraram essa nova fábrica? Removemos até os cabos dos condutos!
Os diretores alemães cumprimentaram o coronel, alegremente, como velhos conhecidos.
– Ah! coronel, como vão as coisas? Alguma ordem para nós?
E isso sem a menor sombra de ironia, simplesmente com atenção voltada a negócios. O diretor técnico da Zeiss continuou:
– Tentamos satisfazer e estamos satisfazendo as exigências na medida do possível, mas estão sendo feitas somente pelo esgotamento das últimas reservas de produção. Isso é um processo interno que até agora tem sido notado muito pouco mas que um dia levará até a completa imobilidade.
Pedi-lhe que fizesse um relatório, juntamente com uma análise econômica do estado da emprêsa, o que levaria de volta a Berlim. Mais uma vez assegurei-lhe que seu nome não apareceria na informação ao Marechal Sokovsky. Adotei o mesmo sistema com dois outros gerentes técnicos, pois eu tinha que apresentar ao general um retrato da situação, embora pouca diferença houvesse entre suas narrativas.
Durante uma visita ao chefe do Departamento Econô mico do Comando de Jena soube mais pormenores das atividades de Dobrovolsky. Com relação à fábrica Zeiss, o comando estava trabalhando para os dois lados. Prontamente auxiliou Dobrovolsky a fazer os "contratos de trabalho, individuais" para os especialistas da Zeiss que iam enviados à União Soviética e, com a mesma rapidez comunicou todos os detalhes dessa medida especial ao representante da A.M.S.
Não obtivemos informações novas do chefe do Departamento Econômico da A.M.S. na Turíngia, mas não ocultou suas queixas contra o general.
– Ele está sabotando o trabalho da A.M.S. desavergonhadamente. Não se importa com o que acontece com as reparações, enquanto gozar do favor de Moscou. Inúmeras unidades de instalações foram enviadas ao Ministério da Indús tria de Instrumentos de Precisão, mas êle não se importa com o benefício delas oriundas. E agora, na União Soviética. estão prendendo homens por não poderem utilizar a maquinária.
Isso era verdade. Por exemplo, numa fábrica alemã, uma instalação e msérie de centena de máquinas especializadas para a producão em massa de certo artigo foi desmantelada e enviada à Rússia, mas, a caminho, uma das máquinas especiais atraíu a atenção de outro demolidor, que, sem mais delonga, mudou o endereço para outro consignatário. Quando chegou ao seu dentino, descobriu-se que se fizera ligeiro engano, pois era uma máquina que não podia ser empregada naquela fábrica, portanto, sem pressa desnecessária, a máquina foi inutilizada. Quando o resto da instalação chegou ao destino exato, e começaram o trabalho de pô-la em funcionamento, descobriu-se que faltava uma máquina. Sem ela a série inteira era inútil e, como não havia esperanças de descobrir-se um substituto da máquina que faltava, o lote todo foi inutilizado. O custo total foi debitado em "investimento de capital" e vários homens foram julgados por sabotagem.